sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

A Divina Arte

Não espero compreensão dos que nunca sentiram isso antes. Não acredito que aqueles que jamais experimentaram essas sensações me entendam e encontrem alguma beleza nessas minhas palavras. Afinal de contas, são poucos os que têm a mente aberta e o espírito suficientemente limpo para compartilhar minhas emoções e me dar razão. "Mas do quê ele está falando?", pergunta-se você. Estou falando do Verdadeiro Esporte. Estou falando da Atividade que, mais do que qualquer outra, une corpo, mente, alma, coração e instinto em um único cenário onde tudo é possível. Estou falando do Jogo dos homens de fibra e brio. Estou falando Daquilo que pode realmente mostrar como e porque uma pessoa pode desafiar todos os conceitos e leis da Física com um simples movimento do braço. Estou falando de Bilhar. Estou falando do prazer que se esconde em cada caçapa. Não quero crer que esse Divino Esporte é para todos. Não, só os que realmente gostam da sensação de desafio é que têm a coragem para encarar de peito aberto as 16 bolas de resina. Não tenho a ilusão de que qualquer pessoa entenda a brilhante sensação que se camufla no verde da lã, sobre a frieza do mármore e a força da madeira. Não tenho a pretensão de imaginar que todos encarem o taco como uma extensão de seu corpo. Não exijo que todo e qualquer ser humano conheça a liberdade celestial de se esquecer do mundo assim que o triângulo está formado e o Jogo está para começar. O que realmente me aborrece é o desprezo com que os que nao têm o dom de apreciar o Bilhar tratam o Esporte. "Jogo de desocupado", é o que dizem eles. Pois qual melhor ocupação existe do que dedicar horas e horas à Divina Arte? Sentir a raiva se apoderar de você ao ver cada bola do adversário sumir nas profundezas escuras dos fundos das caçapas. A dificuldade em controlar a gana de matar aquela bola que está lá, na boca, pedindo com voz doce para ser enviada ao seu propósito, apenas para inutilizar uma caçapa. Saber apreciar o estalo suave de uma bola batendo na outra, a sinfonia perfeita de um estouro inicial ou o ruído apaixonante de uma caçapa engolindo uma bola. Sentir-se cafajestemente satisfeito ao formar um pacau homérico. Mas apesar de tudo isso, sinto compaixão pelas pessoas que nunca terão o prazer quase orgásmico de assistir em câmera lenta uma bola oito rolando displicentemente, como um passeio no parque em um dia agradável, em direção ao fim do Jogo dando-lhes a vitória, fazendo um balão de felicidade inflar-se no peito e explodir em um grito de triunfo. A esses desafortunados, desejo toda a felicidade do mundo. Longe de uma mesa de Bilhar, é lógico.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Só o que cabe falar sobre o assunto.

Não são as palavras, ditas ou escritas, que o provam. Há sempre um algo a mais, uma essência escondida nos milésimos de segundo que passam entre o olhar para a outra pessoa e aquela sensação de ser sugado para um buraco negro. Ele nao está explícito, obscenamente à mostra em prosa ou poesia ou nas diversas declarações criativas e mirabolantes. Não pode ser encontrado nos presentes ou embaixo das poltronas do cinema. Não, ele gosta de se esconder e só vir à tona naqueles momentos de epifania em que as pupilas se dilatam e a vida parece mais bonita do que realmente é, e ele vem com tanta fome e te consome de uma maneira tão despudorada que você pode senti-lo escorrendo pelas costas e indo se misturar à infame normalidade do chão. Ele se esconde no café às quatro da tarde em que você, como se fosse algo casual, comenta sobre o sorriso da outra pessoa. Ele mora no alto daquela árvore onde a gente se apóia para descansar após ter corrido para sair da chuva que começou de repente. Ele gosta de fingir que não exite pra você, e pra isso fica encarcerado naquele "boa noite" despreocupado depois de um cigarro e um cachorro-quente. Há quem diga que ele é feito de matéria celeste misturada com o pó cósmico que chove das estrelas nas loites de lua cheia, tudo isso com um sopro de Deus e depois é espalhado nas flechas de um anjo que vaga por aí à procura de vítimas para seu doce veneno. Mas eu sei que ele não é feito disso. Ele é feito daquele comichão nas pontas dos pés que a gente gente sente quando beija a outra pessoa. Eu sei que ele é feito daquele choque que a gente sente quando olha pra outra pessoa e percebe que ela já estava nos observando há um tempão. Ele é passar o dia inteiro querendo olhar nos olhos da outra pessoa, e quando hora finalmente chega, a gente achar difícil sustentar o olhar porque nos nossos olhos e nos dela dela há tanto brilho que faz até o Sol apertar as vistas e a nossa cabeça doer, mas mesmo assim a gente aguenta e bebe da cachoeira que escorre daquele rosto lindo. É saber o que dizer, quando dizer e como dizer, mas na hora estar tão embriagado pela beleza da outra pessoa que as palavras se atropelam e você acaba dizendo algo inútil, quase sempre com cara de idiota. É saber que mesmo depois de vários anos a outra pessoa vai lembrar de você da mesma forma que você dela: como alguém que tornou o mundo um lugar melhor pra se viver, pelo menos pra ela. É ter a plena certeza de que, aconteça o que acontecer, você sempre estará na memória da outra pessoa como alguém que a fez feliz. É descobrir que seus anjos nunca deixam de te amar. Nunca.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

AQUI, ONDE O SOL NÃO BRILHA TANTO

Não somos boas pessoas. Não temos os mesmos valores que o resto do mundo. Aqui, a ética e a moral, essas duas donzelas, nunca encontrarão paz e sossego. Não conhecemos a piedade ou a misericórdia pois, aqui, essas palavras não valem tanto quanto um relógio ou uma carteira. Quando queremos algo, pegamos. Se alguém nos intimida, a resposta nunca vem tardia. Não conhecemos a lei, não reconhecemos a autoridade de homens de terno que querem nos impedir de levar a vida que escolhemos. Aqui, mais do que em qualquer outro lugar, há apenas duas regras: primeira, viva hoje para repetir a façanha amanhã. Segunda, faça suas escolhas, mas esteja preparado para levá-las às últimas conseqüências. Propriedade? Para nós, um papel de pessoas desonradas não significa coisa alguma. Só é seu se você puder segurar. Somos homens de fibra. Acostumados desde cedo à tortura e ao suplício. Feições duras, cicatrizes pelo corpo, cada qual com sua história. Cada história repleta de dor, angústia e sofrimento. Dos olhos, só resta pouco do brilho. O resto se perdeu na vida vida dura que aqui se sobrevive. Só os melhores conseguem vingar por essas bandas. Homens aos poucos tranformados em animais. Animais, em monstros. Da humanidade que outrora havia em cada um, resta a fala. Mesmo assim, falamos pouco. Ameaças e maldições. Somos todos amaldiçoados. Vivemos na Terra com a certeza do inferno. O nosso consolo é a certeza de que nem os dez mil graus do inferno, nem seu eterno martírio são tão ruins quanto um minuto nessas paragens. Nosso rosto é impávido, desprovido de emoção. Toda a emoção que tínhamos abandonamos ao descobrir que emoção não pára bala, emoção não quebra faca. Emoção não mata inimigo, emoção não compra perdão. Perdão, aqui, custa caro. Dentro de nós só existem três essências. Fúria, instinto, ódio. A fúria que nos mantém fortes para conseguir caminhar por sobre a terra. O instinto que, em face da morte, acelera o coração e aguça os sentidos. E o ódio, nossa força vital, nosso motivo de existir, nossa cachaça, nossa pedra de crack. Não temos esperança. A esperança há muito não dá as caras por aqui. Também não nos faz falta. Se fizesse, a disputaríamos a soco e a tiro, da mesma forma que sempre resolvemos tudo. Não há respeito verdadeiro. Aqui, o respeito tem seis janelas e se carrega na cintura. Amor, não sabemos o que é isso. Amizade, só com nossos punhos. Por aqui, seu único amigo é você mesmo, e mesmo assim, sujeito a traições. Somos adeptos das alianças provisórias. Meu inimigo hoje é meu aliado amanhã, meu assassino semana que vem , meu algoz eternamente. Se de manhã juramos lealdade, à tarde nos desentendemos, à noite somos rivais, de madrugada nos assassinamos. Errantes natos, seguimos um único caminho: o rastro da bala, ora perseguindo-a, ora com ela pelas costas. Nossos destinos são talhados à ponta de faca. Aqui, o preço da vida é tabelado: nove gramas de chumbo cada, à vista, sem desconto. Aqui, não tem paz, nem luz, nem Deus. E se o Tinhoso, o Capeta em pessoa, deixar a segurança e o conforto do seu reino do inferno para conhecer este lugar, que venha de carro blindado e com a alma encomendada.

sábado, 27 de setembro de 2008

Três? Trinta? Treze. Muleque.

"Garoto, pivete, fedelho.
Muleque.
Chato, xarope, pentelho.
Muleque.

Do auge dos meus dezessete,
contemplo meus treze
em que tinha saudades
dos meus três.
Vontade
dos meus trinta.

Doritos, chiclete, Nescau.
Muleque.
Menino. Gente ou animal?
Muleque.

Aqui, nos meus dezessete,
saudosa a limonada do treze.
Não o leite dos três.
Não o destilado dos trinta.

Agora, aos dezessete,
viva o prazer solitário dos treze!
Não a inocência dos três.
Não a luxúria cachorra dos trinta.

Não, dezessete!
Quero a despreocupação dos treze.
Abaixo o esquecimento dos três!
Morte à neurose dos trinta!

Não, dezessete!
Abençoada a mulecagem dos treze!
Esqueça a criancisse dos três,
a adultidade escrota dos trinta!

Treze!
O brilho dos olhos,
o chamego da avó,
o doze do dez.
Idade muleque.

Treze!
Beijo do pai!
Beijo da mãe!
Beijos às escondidas!
Idade muleque!

Treze!
Tudo muito fácil?
Tudo muito difícil?
Não, tudo resolvido!
Ah, minha idade muleque!

Treze!
Que menino inteligente!
Que menino educado!
Pura e simplesmente,
que menino muleque!

Treze!
Não três,
nem trinta.
Jamais dezessete.
Treze! Muleque!

Pois é, meu caro dezessete.
Ontem, três.
Amanhã, trinta.
Para sempre,treze.
Para sempre, muleque."

domingo, 24 de agosto de 2008

OS CANIVETES

Em certo estabelecimento comercial havia uma sociedade de utensílios domésticos extremamente estratificada. Cada um, cada um, cada dois, cada dois era a palavra de Lei. Tesoura não se envolvia com faca. Lugar de caneta era com caneta, e não se juntando com reles cadernos, isso era coisa de lápis e lapiseiras. As bússolas eram tidas como sábias. Todos os caminhos a todos mostravam. Mas foram gradualmente sendo substituídas pelos modernos GPS's até serem deslocadas para a seção de presentes. Ninguém tinha coragem de se meter com os isqueiros. Temperamento explosivo. Até os alfinetes eram fortes, afinal de contas, o que conta é a quantidade.

Mas a mais alta posição da hierarquia ficava com os canivetes suíços. Eles sim eram os donos do pedaço. Havia aqueles de zilhões de funções. Esses eram os mais procurados. Havia canivetes de todos os modelos. Até em forma de cartão. Considerados os modelos, ficavam com o centro da vitrine. Ninguém tinha permissão de falar com um canivete sem prévia autorização do conselho, que mandava e desmandava na loja.

Quando algum bichinho de pelúcia ofendia um chaveiro, eram os canivetes que decidiam de quem era a culpa. Nenhum relógio atrasava sem que os canivetes assim o definissem. Até os modernos Pen Drives tinham por eles um infindável respeito. Os livros da loja morriam de medo das lâminas afiada dos canivetes, tanto quanto o calor que emanava dos maçaricos culinários. E, pasmem, até mesmo os campeões de venda, os telefones celulares, pisavam macio na prateleira dos suíços. O fato é que os canivetes eram os caras.

Mas como em toda bela história, algo de ruim tem que acontecer, e sempre acontece em um belo dia, um belo dia um canivete daqueles simples, com só uma lâmina, soltou uma bomba no meio da elite:

-Não gosto de ser canivete. Prefiro ser um alicate.

-Como assim um alicate? - Inquiriu um gordo canivete de 20 funções. - Tu, um canivete, membro da mais alta camada da sociedade, prefere ser um mero alicate?

-Sim. Sei que os canivetes são extremamente respeitáveis e muito me orgulha ter gravado a laser essa marca, mas não sinto gosto algum em ser apenas um canivete sem maiores funções.

-Mas um canivete tem a mais nobre das funções. - Sofismou um eloqüente multifuncional prateado. - Somos responsáveis por manter a ordem e a justiça neste ambiente. Somos a mais alta casta, e, se assim nascemos, assim devemos perecer.

-O que é que o garoto viu em ser alicate? - Quis saber um conservadoríssimo camuflado.

-Sim, qual o motivo do garoto duvidar da excelência desta classe que há gerações é sinônimo de dever cumprido? - Indagou um clássico de cabo de osso queimado, o mais caro da loja.

-Apenas o simples fato de sentir no frio aço em que fui forjado a vocação para alicate. Sei que carrego comigo a responsabilidade de ser o melhor no que faço, afinal de contas, é para isso que fui feito. Sagrado é o nome que carrego carimbado a chumbo em mim, tão sagrado quanto a missão de perpetuar o significado desse nome. No entanto não consigo encontrar em mim mesmo, do meu cabo ao meu gume a arte de ser um canivete da casa dos suíços. O brasão que carregamos todos em nossos corpos é, e sempre foi, a mais firme garantia de eficácia e qualidade. Somos todos feitos com o mais puro aço. Esse aço que a todos nos forma, é o melhor aço do mundo, e as máquinas que nos fabricaram também o são. Longe de mim querer desonrar e desconsiderar toda essa maestria com que fomos feitos, porém desejeo do fundo de meu brilho metálico e da agudez de que corre por todo o meu fio expandir esse conceito de superioridade que tanto defendem vocês aos mais diversos universos. Tenho em mim todas as qualidades que todos vocês e sonho com toda a minha consciência de canivete ser, não o melhor, mas ao menos um bom alicate. E esse é um sonho cujos caminhos nem o mais afiado de vocês pode cortar, pois depende de mim, e de mim apenas.

E com esse discurso o jovem canivete virou as costas e foi em busca do seu sonho de ser alicate, e naquela loja, dele nunca mais se ouviu falar. O caso foi abafado pela elite dominante receosa de insurreições subversivas. Houve na loja aqueles que ouviram a história do canivete que queria ser alicate, e com ele concordaram. Houve na loja aqueles que ouviram a história do canivete que queria ser alicate, e o crucificaram. Houve na loja aqueles que da história nem tomaram conhecimento e seguiram suas vidas, tal e qual o faziam antes do ocorrido. Mas o canivete partiu. Em busca de seu sonho de ser alicate. Mas o canivete partiu.

quarta-feira, 6 de agosto de 2008

Auto-ajuda automobilística

Esses dias me perguntaram “como anda a vida”. Desde então eu comecei a reparar que a vida tem certa conotação automobilística. Um carro tem toda a capacidade de andar, correr e até desafiar leis, sejam elas estatutárias ou científicas. Um carro se locomove, faz curvas, dá voltas, baliza e pode até andar pra trás. Todas as pessoas são assim. A vida pode nos dar toda a autonomia de alcançar qualquer velocidade, mas para isso é necessário que nos demos a ignição, engatemos a marcha e pisemos no acelerador. Para nós sairmos do lugar precisamos engatar uma marcha, e, conforme formos acelerando, evoluí-la. É difícil passar as marchas, mas não adianta arrancar se não prosseguirmos. Temos a obrigação de evoluir nossas marchas se quisermos ir para frente.
É evidente que de vez em quando encontramos sinais vermelhos por aí e somos obrigados a parar. Mas como disse a sábia sabedoria caminhoneira: “a vida pede passagem”. Pare nos sinais vermelhos da sua vida, mas certifique-se de avançar os verdes. Cuidado ao avançar os amarelos.
Somos carros em tudo na vida. Saímos de fábrica com tudo igual. Potências e torques, acelerações e consumos médios, velocidades máximas e taxas de compressão. O que nos cabe é decidir o que fazer com essas grandezas. Decidir se podemos usar toda a tecnologia dos nossos motores, ou simplesmente andar em ponto morto. Viver na banguela, esperando por descidas para acrescentar alguma emoção à nossa duração. Se bem que às vezes é preciso uma descida para pegar o embalo necessário para uma grande subida.
E é com essas subidas e descidas que devemos ter cuidado. Às vezes nossos carros engasgam e tudo o que conseguimos fazer é olha para essas descidas e esperar que a velocidade aumente. Mas não precisamos descer tão rápido. Lembre-se que os freios funcionam mesmo com o motor desligado. Ou então nos deparamos com subidas tão belas que ansiamos tanto para chegar lá no topo. Mesmo sem saber se o nosso combustível é suficiente. Às vezes ele acaba no meio da subida. Aí então temos duas opções: sermos rebocados para o alto com o esforço dos outros e permanecer no topo, com o tanque vazio, ou voltar e abastecer. Colocar a melhor gasolina do mercado e quem sabe até gastá-la toda no percurso. Mas você chegou lá. E com o SEU motor.
De vez em quando vimos à nossa frente engarrafamentos quilométricos que nos fazem duvidar se será possível chegar à frente de todo esse povo que está aí, buzinando e xingando o do carro ao lado. Mas lembre-se: se todo o mundo está nessa mesma rua, alguma rua em algum lugar está vazia. Pode ser que o caminho seja mais escuro, mais longo e pior asfaltado, mas se você se esforçar e explorar todas as qualidades do seu motor, chegará lá.
Existem pessoas que adorariam um acidente automobilístico só por causa do seguro. Existem carros e carros. Carros modificados de tantas e tantas formas por fora que não se parecem em nada com os originais. Carros bonitos, garbosos e elegantes, mas com o motor corrompido. Carros com uma aparência pra lá de normal, mas que escondem debaixo do capô uma mecânica que pode levá-los a lugares que todos duvidariam.
Que tipo de carro você quer ser? Qual rua na malha viária da sua vida você quer tomar? Eu não sei aonde a estrada da vida vai me levar. Tudo o que posso fazer é apertar o cinto, escolher as entradas certas, dirigir do melhor modo possível, e curtir a viagem. E nunca puxar o freio de mão.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Poesia em verso.

Só nos resta aproveitar essa Vida, pois a Vida nada mais é do que um momento que se prolonga eternamente. Um breve flash da câmera de todos os tempos, uma fração de eternidade que não dura tanto quanto pouco e um pouco mais do que um instante. Tudo quanto sabemos dessa Vida é que um dia ela começa e no outro ela acaba, só nos cabendo a simples tarefa difícil de fazer as escolhas certas e aproveitá-la como se não durasse tanto quanto uma Vida. Um tempo de meia-Vida não existe, pois não existe Vida pela metade. Assim como não existe Vida por completo. A existência axiomática da Vida não se explica com palavras. Meras representações gráficas e fonéticas de um ente deveras rocambolesco e paradoxal. Gerações de loucos, poetas e filósofos gastaram suas Vidas para tentar explicá-las, sem contudo chegar perto da indefinível definição mais do que intuitiva de Vida. Tantos tentaram sem nem ao menos contemplar aquilo que contemplavam. Vidas inteiras gastas em favor da Vida. Não há sentido em explorar a imensurável grandiosidade desse nada que se mostra com as mais diversas faces, cada qual ao mesmo tempo óbvia e complicada. Verdade relativamente absoluta, ou absolutamente relativa, entenda como desejar. Pudera eu conseguir estar diante dessa verdade improclamável de que a Vida é o que é. Todos sabemos o que é a vida, no entanto não conseguimos sequer encontrar nas mais diversas figuras elementos para retratá-la. Confesso que sei o que é a Vida, porém procuro e não faço por encontrar os meios de te fazer saber. Mas posso te dizer pra que serve essa entidade metamórfica eternamente efêmera. A Vida, meu querido, é para ser vivida.

domingo, 25 de maio de 2008

A magia contida nas letras.

Escrever é algo mágico. Você pega papel e caneta, e libera seus instintos. Você não tem preocupações ou compromissos. Ali existem apenas você e a história. A história não se preocupa com a sua roupa. A história não quer saber do seu dia. A história não insiste em ser única. Tudo o que a história quer é um pouco da sua atenção. Ela só quer que você pense nela de vez em quando, tal qual um mulher pensa em uma jóia na vitrine. A história implora de você que você dedique algo de si a ela. Você chega como quem não quer nada. Pergunta como foi o dia dela. Elogia seus cabelos. A partir daí é tão fácil quanto perigoso. Uma tímida frase que se une à próxima e à seguinte, e então, quando se vê, há tantos parágrafos conversando entre si, exigindo continuação, que, se você não controlar sua mão, ela é capaz de te levar a lugares nunca vistos sequer nas mais férteis imaginações. A esse fenômeno damos o enigmático, porém fascinante, nome de história. Escrever uma história não é difícil. Você começa com uma idéia, à ela conecta as magníficas palavras “Era uma vez” e termina no “Fim”. Tudo quanto estiver entre isso, meu amigo, é uma longa da viagem da qual nunca retornaremos.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

Num puteiro qualquer

Sou foda. De verdade. Sou mesmo muito foda. Pego mulher pra caralho. Não vou com esse papinho de conquistadorzinho meia-boca. Comigo é daquele jeito. Ou é ou não é. Se for, vai. Se não for, toma no meio do cu. Mulher gosta disso. Gosta de ser tratada que nem puta. Outro dia mesmo topei uma vagaba num inferninho pouca paga e muita farra. Parecia que não era muito chegada naqueles ambientes. Devia ter ido umas duas ou três vezes num botequim de beira de passeio e achava que tinha a manha de colar naqueles lugares. Fui logo dando uma de macho bem-criado:
-E aí gata! Ta afim de um homem pra te apagar esse sorriso?
Ela me fez pouco caso. Olhou pra mim e uma de princesinha de área nobre, nem falou nada, só virou as costas me mostrando aquele lombo. Ah, não! Não, isso comigo não se faz. Se fosse homem, já puxava da navalha e abria um sorrisão de uma orelha à outra na garganta do safado. Mas uma cocada daquelas merecia um corretivo pra entender que mula que escoiceia acaba com as patas na tipóia.
Enchi a mão direita no rabo da vadia e com a esquerda juntei todo o cabelo dela e puxei pra deixar o ouvido dela bem colado na minha boca. Falei bem com voz de cafajeste:
-Escuta aqui sua piranha, não sou homem de engolir sapo nem pra tira, quanto mais de prostituta de família.
Segurando o cabelo dela, fui logo metendo minha mão por debaixo da saia do vestido dela, no que ela começou a chorar.
-Não chora agora não que ainda não ta na hora. Fica em silêncio e me segue que eu vou te mostrar o que é desacato.
Gritei pro balconista pra me jogar a chave de um dos quartos-de-foder e já fui subindo as escadas. Chegando no cafofo, que só tinha uma cama e uma dessas geladeirinhas, já joguei a desgraçada de bruços na cama e fui tirando o cinto enquanto já ia ameaçando:
-Tu vai aprender que puta boa é puta que respeita seu macho.
E desci o chicote nela com o cinto de couro grosso. Uma, duas, três, mil vezes. Quanto mais ela gritava, mais eu judiava. Quando o lençol começou a ficar encharcado de sangue e de suor, foi que eu parei com a obrigação e ia começar a diversão. Tirei primeiro a camisa de botão e depois a regata. Fiquei de costas pra ela poder ver as tatuagens do tempo da cadeia. As piranhas morrem de medo, principalmente da do enforcado. Tirei um sapato de cada vez. O primeiro eu botei no chão. O segundo eu resolvi jogar na cara dela. Pegou em cheio no beiço de baixo. Sangrou que foi lindo de ver. Perguntei o que ela queria. Ela não respondeu. Perguntei de novo. Ela não respondeu. Sentei na cama e perguntei de novo. Meti um cruzado no olho direito dela. Ela respondeu. Falou que queria ir pra casa.
-Tu só vai pra casa depois que provar de um caralho de verdade.
Tirei minha do bolso da calça e rasguei o vestido dela de cima em baixo. Puta troço feio, todo florido. A cadela tava sem sutiã. A calcinha preta de renda eu rasguei com uma mão só. A vadia era todinha depilada. Fui beijando o pescoço dela do jeito que as mulheres gostam, babando em tudo e lambendo até perto da bochecha. De vez em quando eu dava uma linguada na orelha dela. Fui descendo até os peitos dela. Aí eu não resisti. Eram tão grandes e firmes que eu tive que dar uma dentada. Ela berrou. Eu dei outra. Ela berrou de novo. Eu dei um soco na costela. Ela não berrou.
Fechei e guardei a navalha. Abri a calça. Deitei na cama e mandei ela tirar o meu jeans. Ela tirou bem devagar. Meteu a mão no bolso e tirou a navalha.
-Guarda isso que eu não tenho a noite inteira.
Ela não guardou. Abriu e, mais do que ligeiro, me abriu um talho na coxa. A filha da puta me abriu um talho na coxa. Com a outra perna, meti-lhe uma canelada na orelha. Eu, que já tinha tomado quatro tiros nas costas, ia deixar uma piranha de inferninho me esfaquear e sair inteira? De jeito nenhum.
A canelada derrubou ela da cama, mas ela não largou a lâmina. Tava lá com a navalha Souza balançando de um lado pro outro dizendo que ia me matar. E tanto fez isso, que quando eu fui segurar o braço dela, a vagabunda me cortou a mão. Foi a gota d’água. Peguei o mesmo sapato e joguei de novo na cara dela. Dessa vez foi na testa e ela caiu pra trás e eu aproveitei pra pegar o braço dela e dar uma dentada que fez ela abrir a mão e soltar a navalha. Peguei e joguei pra um canto. Não ia precisar daquilo. No que a vaca tava no chão, já fui chutando a costela. Onde já se viu uma sirigaita de bordel me cortar duas vezes, com a minha navalha? Depois disso, me ajoelhei em dela. Nem queria mais comer aquela cadela. Boceta tem em qualquer canto. Não, o que eu dei pra ela foi muito soco na cara. Ela tossiu e cuspiu sangue no meu rosto. Deixei ela deitada no chão e abri o frigobar. Uma garrafa de whisky picareta, quatro long necks de cerveja barata, dois copos baixos, e dois canecos de chopp. Peguei um dos canecos. Segurei a cabeça dela. Olhei bem naquele olho inchado. Erguei bem alto o copo. Foi um instante pra ele descer. Em cheio na testa dela.
Bem devagar fui me vestir. Estava satisfeito. Coloquei a calça, o cinto a regata e a camisa, os sapatos. Guardei a navalha. Fui dar um beijo de despedida na piranha.
-Ô, vagabunda, quando algum macho for falar com você, trata ele direitinho, ta?
Ela não respondeu. Será que eu tinha exagerado? Devia estar desmaiada. Fui lá e enchi um tapa na orelha dela. Continuava desmaiada. Dei mais três cola-brinco. Nada, botei o dedo no pescoço dela. Morta. Quem diria que um caneco de chopp iria matar alguém? Tanto pior. Ela mereceu.
Pulei da janela pro monte de sacos de lixo em baixo. Ia demorar umas três horas pra alguém entrar naquele quarto. Os gritos? Isso é normal em qualquer puteiro de má qualidade. O importante era que em três horas eu ia estar longe. E mesmo que os tiros fossem encher o saco lá, ninguém ia me denunciar. Porque não tem macho pra mim naquela espelunca, e todo mundo lá sabe disso. Abriu a boca, vai. E digo de novo. Sou foda.

terça-feira, 15 de abril de 2008

I

Proposta:
Redija um texto narrativo, contando uma experiência pessoal em que você tenha sido protagonista de uma situação em que você tenha “se dado mal” em virtude de cometer um dos chamados pecados capitais.



Quem nunca pecou que atire a primeira pedra. Alguém disse isso um tempo atrás. Todo mundo já pecou. Eu, particularmente, tenho meus pecados preferidos: Gula e Preguiça. Mas foram outros dois que em certeza ocasião me fizeram passar um aborrecimento.
Eu estava há vários meses sem nem sentir o cheiro de uma mulher pelada. O motivo não é mistério. Não tenho corro. Meu emprego é horrível, moedor de cana. Por comissão. Razão pela qual não posso ir a bares e boates caras e, conseqüentemente, não pego nem resfriado. Mas todo homem tem uma fera adormecida no seu baixo ventre, que, se não se alimenta, toma conta do seu psicológico e força o indivíduo a ver sensualidade nas mais diversas figuras. Entenda como quiser.
Pois bem. Havia atingido meu limite. A Luxúria me forçava a pagar por um serviço. E a Avareza, a economizar por ele. Fui à casa de massagem A Concha de Ouro. Paguei R$27,00 pelo programa (10% de desconto) e fui para o quarto com uma profissional cujo nome a ética e a vergonha me impedem de revelar. Não sei se o fogo da paixão ou a mania de economia me fizeram dispensar o preservativo.
O fato é que hoje tenho sífilis.





nota: 7,15

sábado, 12 de abril de 2008

Início

começa agora o "mesóclise"
criado única e exclusivamente para postar textos que provavelmente ninguém vai ler.