sexta-feira, 26 de dezembro de 2008

A Divina Arte

Não espero compreensão dos que nunca sentiram isso antes. Não acredito que aqueles que jamais experimentaram essas sensações me entendam e encontrem alguma beleza nessas minhas palavras. Afinal de contas, são poucos os que têm a mente aberta e o espírito suficientemente limpo para compartilhar minhas emoções e me dar razão. "Mas do quê ele está falando?", pergunta-se você. Estou falando do Verdadeiro Esporte. Estou falando da Atividade que, mais do que qualquer outra, une corpo, mente, alma, coração e instinto em um único cenário onde tudo é possível. Estou falando do Jogo dos homens de fibra e brio. Estou falando Daquilo que pode realmente mostrar como e porque uma pessoa pode desafiar todos os conceitos e leis da Física com um simples movimento do braço. Estou falando de Bilhar. Estou falando do prazer que se esconde em cada caçapa. Não quero crer que esse Divino Esporte é para todos. Não, só os que realmente gostam da sensação de desafio é que têm a coragem para encarar de peito aberto as 16 bolas de resina. Não tenho a ilusão de que qualquer pessoa entenda a brilhante sensação que se camufla no verde da lã, sobre a frieza do mármore e a força da madeira. Não tenho a pretensão de imaginar que todos encarem o taco como uma extensão de seu corpo. Não exijo que todo e qualquer ser humano conheça a liberdade celestial de se esquecer do mundo assim que o triângulo está formado e o Jogo está para começar. O que realmente me aborrece é o desprezo com que os que nao têm o dom de apreciar o Bilhar tratam o Esporte. "Jogo de desocupado", é o que dizem eles. Pois qual melhor ocupação existe do que dedicar horas e horas à Divina Arte? Sentir a raiva se apoderar de você ao ver cada bola do adversário sumir nas profundezas escuras dos fundos das caçapas. A dificuldade em controlar a gana de matar aquela bola que está lá, na boca, pedindo com voz doce para ser enviada ao seu propósito, apenas para inutilizar uma caçapa. Saber apreciar o estalo suave de uma bola batendo na outra, a sinfonia perfeita de um estouro inicial ou o ruído apaixonante de uma caçapa engolindo uma bola. Sentir-se cafajestemente satisfeito ao formar um pacau homérico. Mas apesar de tudo isso, sinto compaixão pelas pessoas que nunca terão o prazer quase orgásmico de assistir em câmera lenta uma bola oito rolando displicentemente, como um passeio no parque em um dia agradável, em direção ao fim do Jogo dando-lhes a vitória, fazendo um balão de felicidade inflar-se no peito e explodir em um grito de triunfo. A esses desafortunados, desejo toda a felicidade do mundo. Longe de uma mesa de Bilhar, é lógico.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

Só o que cabe falar sobre o assunto.

Não são as palavras, ditas ou escritas, que o provam. Há sempre um algo a mais, uma essência escondida nos milésimos de segundo que passam entre o olhar para a outra pessoa e aquela sensação de ser sugado para um buraco negro. Ele nao está explícito, obscenamente à mostra em prosa ou poesia ou nas diversas declarações criativas e mirabolantes. Não pode ser encontrado nos presentes ou embaixo das poltronas do cinema. Não, ele gosta de se esconder e só vir à tona naqueles momentos de epifania em que as pupilas se dilatam e a vida parece mais bonita do que realmente é, e ele vem com tanta fome e te consome de uma maneira tão despudorada que você pode senti-lo escorrendo pelas costas e indo se misturar à infame normalidade do chão. Ele se esconde no café às quatro da tarde em que você, como se fosse algo casual, comenta sobre o sorriso da outra pessoa. Ele mora no alto daquela árvore onde a gente se apóia para descansar após ter corrido para sair da chuva que começou de repente. Ele gosta de fingir que não exite pra você, e pra isso fica encarcerado naquele "boa noite" despreocupado depois de um cigarro e um cachorro-quente. Há quem diga que ele é feito de matéria celeste misturada com o pó cósmico que chove das estrelas nas loites de lua cheia, tudo isso com um sopro de Deus e depois é espalhado nas flechas de um anjo que vaga por aí à procura de vítimas para seu doce veneno. Mas eu sei que ele não é feito disso. Ele é feito daquele comichão nas pontas dos pés que a gente gente sente quando beija a outra pessoa. Eu sei que ele é feito daquele choque que a gente sente quando olha pra outra pessoa e percebe que ela já estava nos observando há um tempão. Ele é passar o dia inteiro querendo olhar nos olhos da outra pessoa, e quando hora finalmente chega, a gente achar difícil sustentar o olhar porque nos nossos olhos e nos dela dela há tanto brilho que faz até o Sol apertar as vistas e a nossa cabeça doer, mas mesmo assim a gente aguenta e bebe da cachoeira que escorre daquele rosto lindo. É saber o que dizer, quando dizer e como dizer, mas na hora estar tão embriagado pela beleza da outra pessoa que as palavras se atropelam e você acaba dizendo algo inútil, quase sempre com cara de idiota. É saber que mesmo depois de vários anos a outra pessoa vai lembrar de você da mesma forma que você dela: como alguém que tornou o mundo um lugar melhor pra se viver, pelo menos pra ela. É ter a plena certeza de que, aconteça o que acontecer, você sempre estará na memória da outra pessoa como alguém que a fez feliz. É descobrir que seus anjos nunca deixam de te amar. Nunca.